Grisa entrevista Leo Fazio: o álbum “Paranoia”
O cantor e compositor paulistano Leo Fazio, lançou na sexta-feira (25/02), seu segundo álbum “Paranoia”. Com elementos genuinamente brasileiros em um mosaico de texturas sonoras diversas – recortes de Trap, Jazz, Neo Soul, envolvidos em ambiências “futuristas” e até mesmo “distópicas” – o álbum foi lançado pela Seloki Records, gravadora independente paulistana.
Leo está atualmente morando em Buenos Aires, estudando Audiovisual na UNA (Universidad Nacional de las Artes). Conversamos ao longo desta semana sobre o álbum “Paranoia”, além de suas influências, projetos futuros e outras histórias. Apresento a vocês esta entrevista mais do que especial, repleta de refs que valem a pena serem escutadas/lidas/pesquisadas:
Grisa: Como e quando você começou a trabalhar na obra que culminou no álbum “Paranoia”? Quais eram as suas maiores influências na época?
Leo: Bom, eu comecei a trabalhar neste disco lá pro final de 2019, assim que eu comprei umas paradinhas pra conseguir gravar em casa e montar um home studio. Na época eu estava escutando muito da vanguarda paulista, Itamar Assumpção, Arrigo, Tetê Espíndola, e ao mesmo tempo umas coisas mais modernas como Björk, Tyler, The Creator, King Krule, Maria Beraldo e muito de Jazz contemporâneo experimental, como Robert Glasper e Steve Lehman (que explodiu minha mente quando eu descobri, recomendo demais rs).
Grisa: Eu diria que a sonoridade que você criou neste álbum é muito particular, sinto elementos genuinamente brasileiros misturados à texturas sonoras diversas, intenções de Jazz, Neo Soul, batidas de Trap, sons de clarinete, cordas e outros instrumentos mais “tradicionais” (me permitindo utilizar este termo haha), envolvidos por ambiências “futuristas”. Como foi pra você o processo de criação e a escolha destes sons – desde a composição das faixas, passando pelas etapas de gravação e produção?
Leo: Eu estava nesse bololô de referências e sonoridades que a primeira vista podem parecer um pouco distantes umas das outras, mas uma coisa que me chamou muito a atenção foi que eu comecei a perceber uma grande similaridade, não tanto no som, mas nos métodos de criação e composição de toda essa galera que eu tava escutando, Itamar e Björk habitam um mesmo espaço onírico criativo, mas cada um desenvolvendo sua própria linguagem e estética visual/sonora. A partir disso a minha ideia foi tentar desenvolver mais a minha própria linguagem, refletindo meu próprio contexto, ideias e sentimentos dentro deste espaço (que eu não sei explicar exatamente o que é, mas pra mim ele existe e é bem claro quando a gente presta atenção kkkk).
Grisa: O seu disco me traz imagens super intensas de uma São Paulo crua e real – diria até mesmo “ultra real” – com seus altos e muitos baixos… Como se eu conseguisse sentir daqui o caos em algumas letras e instrumentais seus, e pudesse visualizar recortes de cenas do seu dia-a-dia, momentos entre amigos e conflitos. Você gostaria de contar um pouco sobre a sua relação com a cidade e como a trouxe para dentro de “Paranoia”?
Leo: Tem muito sobre São Paulo mesmo, sobre lugares onde eu passei, onde eu morei e que de alguma forma me marcaram, e também sobre a cidade como um todo e a minha relação com ela, o jeito como ela me engole e me vomita de volta cheio de paranoias. Mas ao mesmo tempo diz muito sobre as relações que podemos criar no meio desse contexto de cidade e de mundo pós-moderno e nos estágios mais doentes do capitalismo neoliberal. Acho que a minha amiga Gabi Jacques (que inclusive participou do disco escrevendo o poema na faixa “Mona Overdrive”) conseguiu sintetizar bem a ideia desse trabalho, pra ela o disco diz algo como “Beleza, esse mundo é realmente muito podre e é importante que a gente perceba isso, mas também é importante que a gente esteja juntinho das pessoas que a gente ama e que fazem toda essa loucura de vida valer a pena”, e eu acho que é exatamente sobre isso, sinceramente é um disco bem mais otimista do que parece kkkk.
Grisa: E a faixa Pirituba City Dream?
Leo: Sobre Pirituba City Dream, eu fiz essa faixa num dia de muita chuva quando eu tava na casa da minha mãe em Pirituba, cuidando dos gatinhos porque todo mundo tinha ido viajar pra Barra Bonita. Eu tinha um esboço de base que não saía do lugar, mas nesse dia veio a inspiração quando começou o temporal e eu fiquei viajando na vista da janela enquanto ouvia Pirituba Pt. 2 do RZO, que eu acabei parafraseando em uma parte da letra rs.
Grisa: Sobre o cover da “Na Próxima Encarnação”, os áudios presentes nessa música são de onde?
Leo: Na Próxima Encarnação em si já é um áudio de Whatsapp, que meu querido amigo Leonardo Chagas (um grande poeta também) me mandou um dia pelo zap e eu gostei tanto que resolvi por no disco hahaha. O áudio do começo eu sampleei de um show que o Itamar fez com o clarinetista Paulo Moura, achei genial a frase dele, muito atual também, e acho que encaixou direitinho nessa versão que é um monte de retalhos colados hahaha.
Ao longo do disco tem várias músicas com áudios de zap zap também hihi
Grisa: E sobre estes encontros e as participações no álbum, como é a sua ligação com os artistas que participaram da obra com você?
Leo: Minha maior alegria com este disco é o tanto de participações que ele teve, muita gente que eu amo e admiro e tenho o prazer de dizer que sou amigo, e cada um deixou seu pedacinho no disco, a seu próprio modo, até minha vó Therezinha participou dessa (ela canta a canção de ninar da faixa que encerra o disco). Se eu falasse aqui de uma por uma daria pra escrever um pequeno livro, então vou deixar só essas palavras aqui, amo vocês que participaram, e muito obrigado por isso <3
Grisa: Qual a história por trás da capa do álbum?
Leo: A foto da capa eu tirei lá no final de 2018 quando estava passando pela ponte estaiada junto dos meus queridos da já extinta banda Molodoys, quando estávamos indo gravar a sessão na Gruta Grita. Eu vi o sol batendo na ponte, saquei o celular e pensei “hmm, vou usar isso algum dia”, e agora quase 4 anos depois, aqui está. Pra mim essa foto representa bem o sentimento do disco, a frieza do concreto com a estrutura da ponte indo em direção a você, como se fossem teias de aranha te prendendo nas suas paranoias, mas ao mesmo tempo esse mesmo totem de concreto também é palco para a beleza do reflexo do calor e da luz do sol.
Grisa: Eu amei as referências à “Sprawl Trilogy” do William Gibson que você trouxe em alguns títulos como “Dex- Brasileira” e “Mona Overdrive” – e para além das letras também senti essa atmosfera cyberpunk muito presente em alguns instrumentais. Fala um pouco pra gente sobre essas influências? Quais outros gêneros e obras literárias te influenciaram na criação de “Paranoia”?
Leo: Quando eu comecei a compor o disco eu também estava lendo Neuromancer, o primeiro dessa trilogia, eu gosto muito de histórias de distopia e principalmente da estética cyberpunk, vaporwave e futurista. Me chama muito a atenção como elas se relacionam e refletem a nossa realidade, e tendo em vista que é um disco que diz muito sobre o agora, acho que foi um processo natural eu buscar essas referências. Além disso outra literatura que me influenciou muito foi a poesia marginal de Roberto Piva, grande poeta surrealista de São Paulo que teve seu maior período de atividade entre os anos 60 e 80, me encantei muito pelo seu estilo visceral de escrita e pelas imagens poéticas que ele traz pro seu texto. O nome do disco, Paranoia, foi inspirado na obra de mesmo nome do Piva, e o poema “O Século XXI me dará razão (Se tudo não explodir antes)” é uma das peças literárias mais geniais que eu já li, e é de uma qualidade profética quase clínica.
Grisa: Como está sendo essa sua nova experiência morando fora do Brasil e quais os seus planos para o futuro próximo? Spoilers de futuros trabalhos são bem vindos haha
Leo: Está sendo uma grande viagem, uma mistura de sentimentos, e sinto que eu estou conseguindo enxergar muita coisa que antes eu não conseguia, sobre linguagem, sobre expressão, sobre cultura, sobre América Latina e sobre o Brasil.
Sobre trabalhos futuros, eu basicamente sou um workaholic de merda kkkk tenho aí planejado 8 discos pro futuro, 3 eu já comecei a gravar, e um deles é um projeto paralelo chamado Naculudu, que eu comecei logo antes de sair do Brasil com meus amigos Marina Mole, Wesley Castellano (um dos fundadores da Molodoys e quem me ensinou a tocar guitarra lá em 2009) e Camilla Araújo (também fundadora da Molodoys), nomes que também participaram do Paranoia. Enfim, acho que até 2029 eu tenho coisa planejada, espero muito fazer outras coisas além disso então é só muita coisa que vai rolar (se o mundo não explodir antes kkk).
Grisa: E o que você mais tem escutado atualmente?
Leo: Tenho ouvido muita música latina, muita música que estando no Brasil eu não tinha tanto contato, descobrindo muitas pérolas incríveis de hoje em dia e de antigamente, Los Piojos, Violeta Parra, Las Sombras, Carlos Gardel… Elis Regina eu ouço sempre já faz tempo, também venho re-descobrindo Charlie Brown Jr., The Verve, Oasis (numa onda muito nostálgica hahaha).
Grisa: Sinta-se livre para acrescentar o que quiser!
Leo: Eu só quero dizer de novo que eu não poderia estar mais feliz em conhecer e ser amigo das pessoas que participaram desse disco, eu amo muito todas elas e queria agradecê-las eternamente, obrigado por deixarem um pedacinho de vocês nisso e obrigado por estarem na minha vida <3
Alguns links:
“Paranoia” no Spotify
Leo Fazio no Instagram: @leossauro
Seloki Records no Instagram: @selokirecs
Bandcamp da Seloki Records : https://selokirecords.bandcamp.com/
FICHA TÉCNICA – PARANOIA
Álbum composto e produzido por Leo Fazio;
Mixagem por Carlos Tupy e Leo Fazio;
Masterização por Christiano Tavares Kuntz;
Lançamento pelo Selóki Recs.
Se Pá…
Leo Fazio • Vocal, clarinete, synth, piano e beat;
Alice Marcone • Backing vocal;
Marina Mole • Backing vocal;
Carlos Tupy • Baixo;
dex- brasileira
Leo Fazio • Piano, synth bass, glitch machine e beat;
Leon Perez • Synths;
SKIPP is DEAD • Guitarra;
Não Vá Tão Longe
Leo Fazio • Backing vocal, synth bass, clarinete, clarone, piano, cuíca e beat;
Luiz Caldas • Vocal;
Dieguito Reis • Vocal;
Leon Perez • Synths;
SKIPP is DEAD • Guitarra;
Cerebral
Leo Fazio • Voz, guitarra, piano e beat;
Carlos Tupy • Baixo;
Marina Mole • Backing vocal;
Leon Perez • Synths;
Irmão Victor • Saxofone;
BLUM
Leo Fazio • Vocal, guitarra, synth bass, piano e beat;
Jonathan Barcelos • Backing vocal;
Temporal No. 1
Leo Fazio • Vocal 2, guitarra e piano;
Quiriku • Vocal 1 e parceria na composição;
Carlos Tupy • Baixo;
Marco Trintinalha • Bateria;
Alice Marcone • Vocal 3;
Dreg • Guitarra;
Mona Overdrive
Leo Fazio • Clarinetes, guitarra, flauta irlandesa, erhu e percussões;
Alice Marcone • Vocal;
Gabi Jacques de Moraes • Letra;
Película de Vida
Leo Fazio • Vocal 1, clarinete, cuíca e guitarra 1;
Lau e Eu • Vocal 2;
SKIPP is DEAD • Guitarra 2;
Dreg • Guitarra 3;
Leon Perez • Synth;
Tenta Mais, Vagabundo!
Leo Fazio • Vocal 1, guitarra 1, piano, synth, cuíca e beat;
Marcelle DISCONeXa • Vocal 2;
Carlos Tupy • Vozes, baixo e guitarra 2;
Marina Mole • Backing vocal 2;
jet-set cosmopolitans
Leo Fazio • Clarinete e synth;
Maura Bazzarelli • Piano;
Adriel Maia • Vozes;
BDSM
Leo Fazio • Vocal 1, clarinete e beat;
Gabrielle Joie • Vocal 2;
Carlos Tupy • Baixo e guitarra;
Festa das Pernas
Leo Fazio • Piano e vozes 1;
Wesley Castellano • Vozes 2;
RegimeTotalitárioRMNYsta • Teclas, synth bass e synth;
RMNY • Vocal 1;
Vítor Marsula • Vocal 2 e beat;
Bianca Marsula • Letra e vocal 3;
Tietê
Leo Fazio • Vocal, guitarra 1;
Carlos Tupy • Baixo;
Leon Perez • Piano e Synths;
Sofia Pellegrini • Saxofone;
Marco Trintinalha • Bateria;
Marina Mole • Backing vocal;
RMNY • Synth FX;
Pirituba City Dream
Leo Fazio • Vocal, glitch machine, guitarra 1, piano e cuíca;
Carlos Tupy • Baixo, synth bass, synth FX e guitarra 2;
SKIPP is DEAD • Guitarra 3 e coro de vozes;
Marina Mole • Backing Vocal
RMNY • Vozes na interferência de rádio;
Cleo • Melodia na interferência de rádio;
Entidades Supermodernas
Leo Fazio • Vocal 1, synth, guitarra, piano, percussão e beat.
Camilla Araújo • Vocal 2;
Carlos Tupy • Baixo;
Marina Mole • Backing vocal 1;
Alice Marcone • Backing vocal 2;
Na Próxima Encarnação
Leo Fazio • Backing Vocal, clarone e clarinete;
Leonardo Chagas • Vocal e violão;
Digital Influenza
Leo Fazio • Vocal, synth e beat;
Chris Kuntz • Guitarra e parceria na composição;
Leon Perez • Baixo;
Diego Simon • Violoncelo;
F:\ TILT
Leo Fazio • Piano e synth;
Vó Therezinha • Vocal.
Engenheira mecânica pela Unicamp e mestre em Engenharia Acústica pela Le Mans Université (França), trabalhou como pesquisadora em acústica musical na Philharmonie de Paris e na Universidade de Edimburgo.
Obcecada ao extremo pelo universo infinito que existe na intersecção entre a tecnologia e a arte, atualmente tem focado na criação de instrumentos musicais "não-convencionais" analógicos e digitais, com os quais produz músicas em seu projeto "Grisa".
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