O Guia do Discólatra #01 – Por que colecionar discos?
Nem tudo na vida precisa de um porquê. Mas se você vai começar a se sujar de poeira nos sebos, comprar plásticos, aprender sobre agulhas, receivers e edições; dedicar espaços e mais espaços da sua casa para armazenar sua coleção e seu som – acredite, você vai – tem que existir alguns motivos e objetivos na sua vida de discólatra.
Você não é obrigado a seguir todos e também nenhum deles, mas essa explicação pode deixar o fantástico mundo do vinil mais claro para você.
Vamos começar falando de…
Por que colecionar vinil é legal?
Começaremos com um assunto que precisa ficar claro: ostentar discos não é a parte legal do colecionismo. Ninguém te impede, mas ser esnobe e bater no peito para dizer “disco pra mim só vale edição original e em perfeito estado” e “morra de inveja, esse só eu tenho” só vai resultar em você afastar outros colecionadores que podem, inclusive, te ajudar a achar aquele discão que você ainda não tem e tanto procura.
Por outro lado, a sociabilidade é um dos pontos mais legais de se tornar colecionador. Quando você começa a frequentar lojas – e se você for fazer isso durante a pandemia (não estou dizendo que deve) faça tomando todos os cuidados, com sua máscara no rosto e álcool em gel nas mãos – acaba conhecendo outros colecionadores, vendedores e entusiastas.
Então, pense como isso é legal: você além de trazer música nova para a sua casa ainda vai fazer amigos, contatos para descobrir discos novos e aprender mais sobre música e tudo que envolve o colecionismo de vinil.
A sociabilidade não é a única vantagem de fazer uma coleção. Em texto publicado no site da Universidade Metodista de São Paulo, a psicóloga Maria Fogo afirmou: “O ato de colecionar desenvolve a metodologia, o senso de observação, a atenção e a paciência. Para que adote uma coleção, a pessoa se coloca em uma condição de estruturar-se e desenvolve competências que lhe permitam atingir os resultados desejados”.
Colecionar discos também muda a sua forma de ouvir música. Vai além de apertar o play no seu streaming e também vai além de colocar a agulha sobre o LP. Você começa a curtir o álbum quando vai até à loja, garimpa o disco (ou pega ele lacrado na prateleira), checa seu estado e compra. Depois, vai lavá-lo e colocar plásticos novos. Na hora de ouvir, vai sentar em uma cadeira e ler o encarte com as letras e a ficha técnica, verá a arte e todo o trabalho gráfico da capa, com seus detalhes.No meio da audição ainda terá que levantar para mudar o lado da bolacha. Não é nada parecido com ouvir o mesmo álbum no seu celular.
Há uma imersão muito mais intensa em ouvir música dessa forma e nem estamos falando sobre catalogar sua coleção no Discogs. Sem contar que aparelhos para ouvir vinil tendem a ter qualidade de áudio superior aos celulares, notebooks, caixinhas bluetooth e fones de ouvido em geral – não só a experiência como o áudio podem ser melhores!
Por que você quer colecionar vinil?
Sim, antes de comprar seus discos e aparelho de som se faça essa pergunta. E há outras questões que você precisa se indagar. Por exemplo: Qual o espaço que tenho para meu som e meus LPs? Quanto de dinheiro e tempo eu vou investir nessa coleção? Eu realmente preciso de mais do que o streaming me oferece? Pode ser que você ainda não tenha essas respostas, mas é bom já ir pensando nessas perguntas!
Um outro toque interessante: pense em alguns dos discos que você pretende ter e pesquise o preço deles no Discogs e, principalmente, em páginas de lojas e vendedores experientes. Procure àqueles que aparentam (por qualificação ou por tempo de atuação em vendas de LPs) ter maior vivência no ramo. Infelizmente o mercado de discos anda muito inflado e alguns preços da “especulação do vinil” podem te assustar – assim como o valor de discos que podem ser raros e você não sabe.
Como nossa tendência hoje é procurar informações na internet, vamos encontrar várias opiniões (muitas vezes confundidas com informações) que podem nos atrapalhar. Uma discussão comum que vejo em grupos e fóruns tem início com pessoas que querem começar a colecionar discos e quando perguntam a opinião sobre uma vitrola são metralhadas por respostas como “é melhor você juntar mais dinheiro e comprar o aparelho X” ou “isso é uma merda, compre um usado em bom estado”.
Ok, as vitrolas de maletinha e semelhantes não oferecem o som excelente que você poderia tirar de um disco de vinil e muitas vezes reduzem a vida útil da mídia mas… E se elas forem sua única opção? Sim, você pode ser colecionador e ouvir música na maletinha!
Nem todo mundo vive em cidades onde existe a oferta de equipamentos usados em bom estado. Tampouco tem condições para comprar um som novo ou conhecimento para avaliar esses aparelhos e fazer suas manutenções mais simples como trocar uma agulha. E ainda: talvez a pessoa não sinta a necessidade de ter um equipamento incrível para ouvir música – você pode gostar de vinil e não ser um audiófilo que tem um som hi-end e fica comparando edições de um mesmo disco!
É preciso deixar claro: não existe uma verdade absoluta para aplicar à coleção de um assunto. Você pode colecionar figurinhas e não colar em um álbum, você pode ter uma coleção de jogos de Super Nintendo só com cartuchos piratas, você pode colecionar seus Funko lacrados na caixa. A sua coleção é sua.
Voltando à pergunta principal, existem várias respostas para o que você pretende com a sua coleção. Pensei em algumas respostas amplas e possíveis que organizei abaixo. Vamos pensá-las juntos?
“A moda do vinil voltou, acho essa onda irada, ainda mais que estão saindo discos de bandas novas que me amarro” – Prepare o seu bolso e suas redes sociais. Muitos discos esgotam no dia em que são anunciados e o melhor jeito de garantir é fazendo parte dos clubes de assinatura e acompanhando as redes dessas empresas. Como possuem tiragens pequenas, muitos títulos são vendidos a preços altíssimos logo após seu lançamento. Procure os grupos especializados nesses LPs no Facebook!
Vale a pena comprar um som que seja pelo menos intermediário, afinal esses discos não são baratos e se você colocá-los embaixo de uma agulha que seja muito pesada (como a das maletinhas) com o tempo eles irão se desgastar.
Tenha em mente que se o vinil para você é uma moda e algo que você quer curtir apenas na fase atual da sua vida, alguma hora você irá desapegar deles. Cuide bem das suas bolachas para quando for revender!
“Tenho uns discos herdados e não quero me desfazer. Gostaria também de comprar alguns outros devagar, sem muito compromisso” – Fique sempre de olho nos vendedores de rua e nas lojas de LPs usados (esteja ligado aos saldos, é lá que mora o tesouro!). Em algumas feiras o sucesso também é garantido. Alguns vendedores gostam de levar discos para vender rápido e em quantidade, com um preço menor.
Pense em qual é o máximo de dinheiro que pretende gastar em seu aparelho de som e procure por algo mais próximo desse teto – principalmente se for um aparelho novo, pois os mais baratos sempre tendem a ter qualidade inferior. Se for usado, procure o que esteja em melhor estado e dê preferência a um com motor que opere com correia (belt-drive). Um 3 em 1 vai te servir perfeitamente – e os horizontais são mais legais!
“Quero ter uma coleção irada com meus álbuns favoritos que fizeram a diferença na minha vida” – Faça uma lista de quais discos são esses e dê uma pesquisada em seus preços. Se pretende ter discos clássicos e/ou raros prepare o seu bolso e esteja sempre visitando lojas e vendedores de rua – o garimpo será sempre seu aliado. Pesquise sobre edições de luxo, comemorativas e compare com o preço das originais.
Como esses álbuns tem uma importância afetiva para você, experimente comprar um aparelho de som que seja no mínimo intermediário, para poder ouvi-los em uma qualidade boa – afinal, são os discos da sua vida!
“Sou apaixonado por ouvir música, acho vinil o máximo e quero ouvir um som de qualidade” – Seja um colecionador de corpo e alma. Visite as lojas, os vendedores de rua, os sites, faça parte dos clubes de assinaturas, participe de grupos virtuais, e consuma tudo que couber no seu orçamento (ou que caiba mais ou menos ou que nem caiba, siga o seu coração). Se prepare para uma coleção que nunca vai ter fim e esteja sempre pesquisando sobre o assunto.
Para ter um som excelente com seus LPs monte um sistema de som modular (amplificador, caixas e pick up, a princípio) e aprenda a regular todos os ajustes finos do seu equipamento.
Considerações finais
Nenhum outro aliado é mais importante ao colecionador do que a paciência (talvez dinheiro infinito, mas estamos no mundo real). Pesquise, leia e principalmente: tenha paciência. Talvez você leve anos para encontrar o LP que tanto quer ter e pode ser que quando o encontre ele esteja custando um valor que você não pode pagar. Da mesma forma, você pode um dia entrar em uma venda de garagem e achar esse disco por cinco reais. Então seja paciente e pense sempre nos seus limites. Nunca deixe de garimpar!
Não comece sua coleção pelos discos mais caros – que certeza você tem de que não vai desistir dos LPs em dois meses? Portanto, não saia torrando toda a sua grana em discos só pelo seu status de clássico/raro. Há muito disco incrível entre os vinis baratos. Aproveite que agora você poderá conhecê-los na sua vitrola!
- Texuga lança EP com canções de “Escárnio e Maldizer” - 28 de julho de 2023
- Entrevista – O Grito fala sobre seu novo single, “Tá Todo Mundo Ficando Frito” - 21 de outubro de 2022
- Elifas Andreato, autor de capas históricas da MPB, morre aos 76 anos - 29 de março de 2022
Pingback: Guia do Discólatra #05 - Como começar a garimpar discos - Disconversa